Trabalhar com o sofrimento humano é também trabalhar com medo. Pra entender como esse medo rege muitas das nossas escolhas, é preciso olhar pra dentro. E olhar pra dentro é difícil, de repente gera até mais medo.
Tem gente que tem medo de como vai ficar no futuro.
Tem gente que tem medo de olhar praquilo que doeu no passado.
Tem gente que tem medo do que precisa fazer no presente.
Medo todo mundo tem. E tem gente que tem medo de olhar pra si e descobrir que somos responsáveis por muita coisa. Já falei aqui num outro texto sobre no fundo, ninguém ser um alecrim dourado. Mas depois de anos de sistema capitalista, auto cobrança excessiva, super produtividade, dentre tantas outras dinâmicas tóxicas sócioeconomicoculturais… nosso cérebro criou um grande pavor diante da RESPONSABILIDADE.
Responsabilidade é a qualidade do que é responsável, ou obrigação de responder por atos próprios ou alheios, ou por uma coisa confiada. A palavra responsabilidade está relacionada com a palavra em latim respondere, que significa "responder, prometer em troca". Desta forma, uma pessoa que seja considerada responsável por uma situação ou por alguma coisa, terá que responder se alguma coisa corre de forma desastrosa.
Primeiro: a responsabilidade de obrigações, porque se é obrigação já parece chato. Se parece chato eu não quero fazer. Se eu tenho que fazer uma coisa chata por obrigação, a tendência é do meu querido cérebrozinho me proteger e repelir a ideia de lidar com isso. Se eu tenho que fazer algo que eu não gosto, é pouco provável que vou querer me dedicar àquilo… quem dirá me aperfeiçoar e me tornar bom diante do que me é imposto. Nosso cérebro quer mais é que se foda mas… você e eu já sabemos que não dá pra viver só do que gosta né?
Segundo: responsabilidade diante das consequências. Esse bando de gente ansiosa (eu inclusa) também quer ser livrar de coisas ruins que o futuro pode trazer, mas… também existe o medo de escolher porque afinal estamos fadados a sermos reféns das consequências das nossas escolhas. E já que não podemos prever o futuro… muitos são paralisados por esse medo. Como se escolher continuar onde está já não fosse uma escolha que, olha só, também traz consequências. É muito difícil pro ser humano assumir os seus b.o’s afinal, é muito mais fácil botar a culpa no outro e tudo que está fora de si. (o que obviamente tem sua parcela e influência, afinal como diria o palhaço “vivemos em uma sociedade”). Reclamar e ficar lamuriando por aí pode ser até terapêutico, mas na prática não resolve muita coisa. Imagina, ter que assumir pra si (e às vezes pro mundo) que algo deu ruim por sua própria escolha que não foi das melhores? Ou que nada muda porque, dentro daquilo que está ao seu alcance (ou que é sua responsabilidade) você mesme não mexe um dedinho sequer pra que a mudança aconteça? Dói né? Escolher é também renunciar. Escolher é um grande jogo de apostas. Você toma riscos o tempo todo, sem nunca ter certeza absoluta do resultado. Quanto menos certeza, mais riscos e mais escolhas nas próprias mãos… mais medo. Não dá pra se poupar de consequências, e consequência por si não significa apenas coisas ruins/caos/destruição. Se poupar do risco também é se poupar da mudança e de coisas boas.
Terceiro: o outro lado do exagero. Tem gente que não quer se responsabilizar por nada. E tem gente que acha é responsável por tudo. Acha que tudo tem que estar em suas mãos. Tem que ser sempre conciliador. Regulador emocional de terceiros. Mediador de conflitos em que não está envolvide. Por aí vai. E sabe o que isso significa? Que quanto mais responsabilidades do mundo eu tomo pra mim… menos eu me dedico em tomar as rédeas daquilo que de fato sou responsável. Ou seja, mais um mecanismo de defesa que seu cérebro liga pra te poupar. Não vou lidar com o que é meu, assim não preciso olhar pra mim porque afinal… dói.
Quarto: nada é tão simplista e extremista quando a gente fala da experiência humana, motivos, causas e afins. Pensar e lidar com responsabilidade traz à tona vários tipos de medo diferentes: medo de falhar, medo de ser insuficiente, medo de não dar conta, medo de comprovar que se é um fracassado, medo de comprovar que é burro, medo de surtar, medo de ficar mal, medo de ser julgado, excluído, rejeitado, punido e não amado. Nossa, tudo isso tem a ver com responsabilidade e olhar pra si? SIIIIM, show de bola né? Mas então… como faz?
Existe todo um discursinho sobre coach e mindset que você já deve ter ouvido por aí. E obviamente eles roubam muita coisa da psicologia só pra dizer que inventaram a roda, simplificar e vender soluções fáceis. Mas eu repudio tudo isso rs. E hoje eu também não vim dar resposta nenhuma porque não tem receita de bolo, vai fazer sua terapia meu anjinho.
Fiz toda essa introdução pra poder fazer aquilo que gostamos tanto: reclamar. Mas antes um disclaimer: eu sei que pessoas possuem sintomas devido diagnósticos, reagem diferente mediante sofrimentos etc etc etc. Trabalho com isso todo os dias e tá tudo bem, mas aqui eu só tô reclamando como um serumaninho que interage com pessoas também na vida pessoal, ok? Ok.
Uma coisa que passou a me irritar com o passar dos anos, foi perceber quantas vezes na vida fui afetada pela falta de responsabilidade das outras pessoas. A gente tem tanto B.O pra lidar na vida e ter que sofrer o respingo alheio, é chatão demais. E claramente eu também vejo isso no trabalho, não só as pessoas que não se responsabilizam mas aquelas que também ficam pagando o pato por quem não faz o seu.
Vi um meme na rede que me fez pensar inicialmente que será que tô virando a tiazona do pavê por rir muito disso? e em seguida bateu a sensação de: acho que estou chegando naquele momento da vida… onde eu olho pra coisas/pessoas/situações e um dos primeiros pensamentos que me vem é: não tenho mais idade pra isso.
Pelo tanto que eu já reclamei da minha família disfuncional aqui, vocês já devem imaginar que estava passando por isso desde que me conheço por gente. Houve situações extremas incluindo roubo de dinheiro da minha pensão e até quase sofrer acidente de carro por imprudência proposital. Mas enfim, como uma jovem inocente eu achei que meus problemas com isso acabariam assim que eu saísse de casa e estivesse livre dessas pessoas. Aí eu esqueci por um momento que não era só na minha casa que tinha um bando de arrombado… e a vida foi me lembrando que é uns quarenta arrombado por metro quadrado só que no mundo todo.
Já acostumada a me virar depois que saí de casa, foi em um namoro que eu aprendi a olhar pra escolha de quem a gente quer do nosso lado numa perspectiva de longo prazo. Os pais desse desquerido queriam dar de presente pra ele um apartamento, mas ele ficou revoltado com a proposta, alegando principalmente que não estava pronto pra uma responsabilidade dessa. Um homem, adulto, que já morava sozinho, concursado… mas que levava as roupas pra mãe lavar aos finais de semana e era ela quem montava (colocava comida n) o prato dele quando ia lá almoçar. Ah… significa né? Vi ali qual seria meu destino se continuasse naquela relação. Que a imaturidade e falta de responsabilidade por coisas BÁSICAS de uma outra pessoa, iriam em algum momento me afetar. Ou um outro ex que eu pagava terapia, ele não ia, parou de fazer e não me avisou… e se não fosse o psicólogo me contar, sabe-se lá quanto tempo eu ficaria rasgando meu suado dinheiro. Nada como exemplo de macho adulto irresponsável pra ilustrar quase tudo que há de errado no mundo né kkk (risos nervosos) Mas como em exemplos anteriores, o problema não é só numa relação afetiva. Não vou nem começar a falar de trabalho porque né….
Enfim, aí chegou a vida pós trinta (já faz um tempinho kkk) e esse sendo um ano de tanta reflexão e descoberta, veio o famigerado momento que… chega né? Além de estar velha demais pra isso, faz uma diferença do caralho poder conviver com pessoas que “estão na mesma vibe que você”. Vibe, momento de vida, valores, dinâmica, maturidade… Mesmo dentro de tantas diferenças, tem coisas do outro que sim afetam muito a gente. (não é sobre todo mundo ser igual e estar vivendo as mesmas coisas alouuuu) Saber o que é nosso e o que não é, ajuda muito. Sair do papel de S.O.S salvadora da pátria, também é libertador. E sim, eu sei que ninguém é igual a ninguém. Mas como é satisfatório conviver em paz sem respingos. Quando falamos em nos cercar dos nossos, penso que esse também é um tipo de filtro a se incluir.
É que também, como a definição que eu colei do google pra facilitar pra vocês, responsabilidade também tem a ver com os outros. Quando você tem medo ou negligencia suas responsabilidades, você também caga no coletivo e não só na sua própria vida. Isso afeta suas relações como um todo. Afeta seu trabalho. As pessoas se afastam, se cansam. E aí né, não vai dar pra ficar se candidatando pra prefeitura da coitadolândia pra sempre.
Enfim: assuma teus b.o, tome rédea da sua vida, vai aprender lidar com suas dificuldades. Busque paz. Deixe os outros em paz. Busque terapia e conhecimento. (alô bilu) Afinal imagino que se você está lendo isso aqui, já é um adulto. Se é funcional é outra história né. Não deixe o medo de lidar com responsabilidades estragar seu presente e seu futuro, muito menos o dos outros. (desculpa o desabafo, estou revoltada com a falta de responsabilidade dos outros essa semana kkk)
CODA (child of deaf adults) acompanha uma jovem que está se descobrindo para além da sua bolha familiar onde todos são surdos. É um filme muito gostosinho de assistir, cativante e com vários momentos emocionantes. Sobre comunicação, trilhar o próprio caminho e tantas outras coisas. Com atuações riquíssimas. Muito bom.
Lowlifes mostra uma família encurralada por dois homens estranhos e acabam tendo que passar a noite na casa deles… e coisas acontecem. É um filme bem divertido e foi uma grata surpresa. Teve vários momentos que pensei que fosse detestar mas é porque todo mundo é detestável mesmo, então tudo bem. Indico aos fãs de plot twist atrás de plot twist.
Nine Days tem um cara que entrevista cinco almas pra decidir qual delas vai poder descer pra Terra pra viver, mas acaba no meio do caminho tendo algumas crises existenciais. Tem ótimas atuações, boa premissa, momentos bonitos, alguns pontos pra reflexão mas… extremamente esquecível. Mesmo não descaradamente passou uma vibe meio religiosa demais pro meu gosto.
Synchronic paramédicos encontram mortes ligadas a uma droga que faz com que as pessoas voltem no tempo. Achei chato, ritmo que quebra a experiência. No começo parece dar um tom de terror e se tivesse seguido por essa linha talvez fosse mais interessante.
The Lair of the White Worm Eita porra o tesão no cinema de novo! Num cantinho afastado na Inglaterra, um crânio misterioso é escavado e uma gostosa o rouba pra adorar seu deus pagão, que precisa de carne virgem!!!! kkk Tesão, nonsense, símbolos, falocentrismo, trasheira e tudo junto que funciona bem e aquece o coração. Simplesmente adorável.
Rabid Uma introvertida que trabalha no mundo da moda sofre um acidente e a cirurgia de reconstrução a deixa mais bonita e faminta… por carne humana! Achei ousadíssimo fazer um remake do Cronenberg e pela consciência disso parece que as irmãs (diretoras) usaram esse filme como uma forma de homenagem. Não é de todo ruim, mas nada demais. Teve pontos que me irritaram e achei desnecessário pra trama. Mas ao todo, vale um divertimentozinho.
Siberia Willem Dafoe no tropo QUE LOUCURA É ESSA BICHO. Vou ter que ver de novo porque não entendi quase nada kkk teve momentos que eu tava gostando e outros pensando eita que isso me perdi. Mas Willem é ótimo em tudo que faz, sempre.
Empire of Light dois funcionários de um cinema nos anos 80 começam a se relacionar, lutando as próprias lutas e… Tinha tudo pra ser bom depois fica tão morno que no final tá frio demais pra ser lembrado. Foi a forma do Sam Mendes dizer que r4c1sm0 é ruim, com elenco bom e roteiro xoxo.
The Outfit um alfaiate que faz ternos pra máfia acaba se envolvendo numa enrascada e precisa usar a lábia pra contornar tudo e sair vivo. Mark Rylance arrasou nesse, é ótimo vê-lo como protagonista. Chega um momento que tudo fica meio previsível mas é uma ótima jornada de qualquer forma. Bem amarrado pra um filme de ambientação única. Indico aos fãs de plot twist novamente rs
Coup! Um golpista se infiltra como cozinho na mansão de um casal riquíssimo e de repente a gripe espanhola assola o país. Mas ele tem o plano de tomar conta de tudo com a ajuda dos outros funcionários. Super divertido. Eu amo (quase) tudo que o Peter Sarsgaard faz.
The Gift Um casal se muda e acabam encontrando um conhecido de infância do marido, que passa a presenteá-los com certa frequência até que… coisas acontecem rs Tem boas atuações e até uma boa construção mas se perde. Tem um negócinho sobre a visão e “utilização” da personagem feminina que me incomodou demais então sei lá…