Estava eu bela e plena na minha terapia reclamando dos defeitos alheios e como era afetada por eles, quando meu querido psicólogo rebate “ok mas e os seus defeitos? quais são eles e como eles afetam os outros?”. E eu respondi na lata, afinal ele está comigo nesse processo terapêutico desde 2011. Nem titubeei.
Ao mesmo tempo que listava pra ele em ranking dos meus principais defeitos e como me afetavam, comecei a pensar sobre quais deles eu poderia melhorar. Me esforçar e tentar. E quais eu não abria mão. Eu não quero ser perfeita e não quero ser uma escrota. Aliás sou grande fã da seguinte frase da Clarice Lispector:
Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro.
E eu sei que mesmo meus defeitos, sendo o que são, alguns deles me sustentaram pra chegar até aqui. Mas sem papo motivacional: é preciso reconhecer que não dá pra ser alecrim dourado a vida inteira.
Na realidade, de perto, ninguém é flor que se cheire. Amizades são destruídas pela convivência. A presença constante na vida adulta estraga a visão imaculada da família que tínhamos quando criança. O aumento da taxa de divórcio devido a pandemia não veio do nada. Os detalhes incomodam a gente. Ao mesmo tempo que são magníficos e nos atraem no outro, são as pequenas coisas que podem levar ao desprezo.
A gente adora culpar os outros. É uma das coisas mais fáceis a serem feitas ao longo da vida. O quanto erraram com a gente. O quanto somos obrigados nos curar das feridas que nos machucaram. E a gente esquece que já machucou alguém. Que é o vilão na história do outro. Que tudo aquilo que você considera o máximo em você mesme, pode ser motivo de revirar os olhos em outro ponto de vista.
Sem culpa católica, meu único confessionário é na terapia. Meu psicólogo sabe de todos os meus pecados. Tudo de errado, imoral, sujo e propositalmente escroto que eu fiz. Quando olho pra mim e me vejo como uma pessoa incrível, também acabo pensando naquela famosa frase:
Jesus te ama porque não convive com você.
Ninguém precisa saber de tudo. Cada um que carregue sua “cruz”. Se eu já sou julgada e criticada por não gostar de cozinhar e não querer ser servente de ninguém, imagina se soubessem do meu histórico. Não que eu tenha feito coisas extremamente horrendas, crimes hediondos e coisas do tipo. Mas com certeza no crivo de um ou de outro, eu não passo. E objetivo nem é passar.
Não sou a favor da autodepreciação. Já fui um dia. Tive minha fase amargurada niilista e só hoje consigo ver o resultado disso. Sei lá se você acredita nessa onda de você atrair o que você transmite. Às vezes eu acredito. Mas por favor, sem positividade tóxica. Mas voltando, não sou a favor da autodepreciação e não estou aqui pra confessar as coisas erradas que eu fiz. Mas acho de extrema importância esse outro lado do autoconhecimento.
Autoconhecimento não é só reconhecer a pessoa incrível, capaz, linda, cheia de possibilidades que você é. É também reconhecer o lado feio, sujo, imoral, sem filtro e hipócrita que habita em você. Quando ele vem à tona. Porque ele vem à tona. Qual a função dele no seu funcionamento. Ninguém é alecrim dourado.
Pensei em tudo isso também vendo polêmica no site mais chorume da internet, o twitter. Onde uma queridinha toda vez que fica solteira expõe sempre os ex como pessoas horríveis. Olhei e me identifiquei, apesar de que eu realmente tive ex HORRÍVEIS. E pensei no quanto seria capaz de expor cada coisa que passei no seu mínimo detalhe. Talvez algumas pessoas leriam e identificassem logo de cara quem eram (o famoso só quem estava lá sabe). Outras fariam a maria leva e traz e iriam correndo com os prints. E nisso, como com o que aconteceu com a queridinha, vários julgando a posição dela. Outros julgando os machos. Outros apoiando, se identificando e sentido representados.
É muito fácil rolar uma identificação com a posição de ser vítima de algo ou alguém. De uma pessoa ruim. De uma atitude ruim. De um infortúnio externo. De um evento aleatório da vida fora do seu controle. Ninguém quer ou gosta de se identificar com lado do opressor. Da pessoa que fez merda. Que reage mal. Que julga. Que dá palpite quando não é chamado. Ninguém quer se identificar porque dói. Dói admitir pra si que a perfeição não existe. Que você pode tentar ser cada vez melhor, cada dia que passa, mas você nunca vai atingir esse patamar imaginário de Madre Teresa de Calcutá. Não dá.
De perto ninguém é perfeito. E não digo isso de uma forma de dar carta branca à escrotisse e maldade intencional. Se possível melhore, mas primeiro reconheça.
Sempre tive a Síndrome da Boazinha. Ainda tenho resquícios (já fiz um texto sobre isso na newsletter antiga que foi descontinuada, talvez possa trazer novamente refeita pra cá). Mas quando abracei meus defeitos também desapeguei desse ideal. Claro que quero que as pessoas gostem de mim e continuem me vendo como a pessoa incrível que eu sou. Mas não é uma necessidade. Não todo mundo. Fiz as pazes com o papel de vilã que possivelmente tenho na vida de um indivíduo ou outro. Entendo, não quero consertar isso. Não mais. Quero seguir. Brilhando de longe e talvez fedendo se chegarem perto demais ao ponto de enfiar o nariz no meu suvaco. (eu uso desodorante direto, mas não sou de ferro)
Desculpa o tanto de termo religioso, na real eu sou agnóstica, mas uso como advérbio de intensidade.
Às vezes quando não sei o que quero assistir coloco qualquer coisa que “todo mundo viu menos eu” e fui de Shazam! Fury of the Gods. Mais um filminho de herói totalmente esquecível e que se contradiz quando mostra personalidades diferentes do mesmo personagens em ambas versões. Uma pena, tinha gostado do primeiro.
Posterguei e finalmente dei uma chance pra The Cabin in the Woods. Cinco colegas vão passar um final de semana numa cabana no meio do nada só que na realidade não é aquele clichê que você já imaginou só de ler até aqui. Me diverti horrores e gostei muito! Filmão incompreendido.
Spiderman Across the Spider-Verse é perfeito. Não tem um defeito sequer além de que acaba. Uma obra de arte. É tudo isso que estão falando e mais um pouco. Não tenho nem como falar muito além disso.
Pra dar uma descaralhada vi Errors of the Human Body, onde um cientista é chamado pra um novo emprego na Alemanha pra contribuir com um novo projeto importante de regeneração de genes, meio que pra suprir uma tragédia pessoal e aí as coisas vão acontecendo. Bem bacana e com o talentosíssimo, porém subestimado, Michael Eklund.
A decepção da semana se chama Veneciafrenia. Que de primeiro parecia uma coisa bem homenagem, referências e coisas bacanas e depois ficou um meh. Um grupo de turistas em Veneza são perseguidos por uma galera contra imigrantes. Temas xenofóbicos me estafam, passável.
Terminei a terceira temporada de Love, Victor pois não queria usar um neurônio sequer. E muito bonitinho ver personagens bissexuais representados pra galera jovem poder se identificar e sentir que está tudo bem. Talvez eu precisasse de séries quentinho no coração assim quando eu era jovem.
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eu sempre leio tuas news e comento aqui só sobre filmes/séries — é um defeito meu, desculpa. Queria ver essa Casinhas no Mato aí, vou assistir depois de te ler.