Finalmente attack on titan chegou ao seu final (no anime). Por ser uma história surpreende, cheia de técnicas narrativas interessantes etc, foi uma boa jornada até aqui. Eu não consigo fazer análises assim que as coisas acabam, só uns dias depois quando sento pra escrever. E achei que AOT merecia pois foi um evento.
A primeira vez que assisti sozinha, vi só até a metade da segunda temporada. Mesmo achando bom, eu nunca tive o hábito de assistir anime com certa constância. Anos depois quando comecei namorar um otaku, fiz a recomendação e passamos a assistir juntos. Um casal de amigos queridos entrou na dança com a gente, nos atualizamos e passamos a assistir em grupo as partes finais. Fizemos bolão de quem morreria. Nos reunimos no último sábado e acabamos essa saga.
todos somos titãs
Entre muitas analogias feitas ao longo do anime, essa é uma das principais que ficam claras. Nas primeiras temporadas e arcos, os titãs (pelo ponto de vista dos personagens) são mostrados como criaturas monstruosas que representam tudo aquilo que eles temem. Morte, destruição, caos. Aquilo que é feio, não controlado e perigoso. Esses são em primeiro ponto o inimigo alvo, que precisam ser erradicados para trazer um senso de segurança para o povo das muralhas. Com o passar dos capítulos mais informação nos é jogada e nos damos conta que os titãs já foram pessoas “comuns”, como eu e você. A dinâmica do anime começa a mudar com esse fator revelado. E essa é só mais uma verdade humana que tentamos ignorar e controlar a qualquer preço. Já falei várias vezes aqui que ninguém é um cristalzinho isento de defeitos. O ser humano nasce instinto, meio bicho, tem parte do cérebro que chama “reptiliano” de impulso, por aí vai. Dentro de todo mundo existe um lado podre e caótico reprimido cada vez mais, cada dia que passa. A gente tem medo de olhar pra esse lado e pensar no que poderia ser caso isso rolasse solto. Titãs, nós seríamos humanos desengonçados sem refinamento, atropelando e destruindo coisas. Machucando os outros sem muita distinção. No anime a gente vê como um estímulo visual e representação gráfica. Já na nossa vida, vou deixar pra falar outro dia.
a bolha + moral questionável
Você tem a sua, eu a minha. A bolha funciona num esquema de ponto de vista. Quando você pertence a um grupo específico (uma bolha), existe uma análise mais empática e profunda porque o acesso às informações é facilitado. Tá ali, estampado na convivência, é mais fácil de ver/ouvir/aceitar. A diversidade dentro da bolha existe, mas não é tanta a ponto de você considerar que essa pessoa é de um grupo FORA da bolha. Já aqueles que não pertencem à bolha, são os outros. E os outros são apenas isso, outros. Quem está de fora não é visto de um ponto analítico e diferencial. Se você não tem informações o suficiente, é todo mundo jogado na mesma categoria: os outros. E é assim que funciona AOT. Nas primeiras temporadas tudo aquilo que experienciamos é nos mostrado a partir do ponto de vista DA BOLHA eldiana de paradis, Eren e seus amigos. Nós, como espectadores, atribuímos valor com a informações que nos são passadas do ponto de vista específico dos personagens. Até que nas temporadas finais, o cenário muda. Os marleyanos são uma outra bolha, e a outra bolha, criada com vivências culturas etc específicas, mostra um outro ponto de vista. Para os marleyanos, os eldianos de paradis são “os outros”. A ética e a moral são construídas de acordo com cada ponto de vista, e isso também nos afeta. E agora que conhecemos os dois lados? Bom, agora que nada justifica a violência. No mundo ideal, o caminho é onde as bolhas se encontram, se ouvem, conversam e tentam conciliar seus pontos. Mas ambas as bolhas transformam o medo e o ódio em guerra. E é a guerra que faz com que crianças cresçam para se tornarem soldados, homens viram monstros e assassinos, todo mundo acaba morto ou fudido da cabeça. Nenhum lado ganha. O único modo de conhecer fora da bolha, é ouvir quem está do lado de fora dela. Sempre seremos heróis da nossa própria bolha e inimigos na visão de um outro fora dela.
eren é o mesmo, do começo ao fim
O Eren nunca mudou no anime. Ele mostra, do começo ao fim o que é. O que acontece é que todos os eventos foram potencializando o seu verdadeiro eu. Mostrando pra ele que ele sempre teve razão na sua visão de mundo. Criando fatos inegáveis. Permitindo que tudo aquilo que ele sempre acreditou, só desabrochasse cada vez mais. Eren sempre pregou seu ódio pelos titãs, por acreditar serem o grande causador não só de toda sua dor, mas também da privação de sua liberdade. Seu objetivo desde o começo era eliminar todos os titãs, e no final ele conseguiu. Porém no meio do caminho, o foco do inimigo alvo muda. Não são mais os titãs e sim os marleyanos. As motivações são as mesmas, ele só direcionou o foco. Desde criança, Eren é sedento por morte e destruição, movido pela força do ódio e sangue nos olhos. Mas ele é um protagonista, injustiçado, então nos compadecemos. Depois de virar um ovo mexido dentro da sua própria cabeça pra viver passado/presente/futuro em tudo e todo lugar ao mesmo tempo pra sempre, Eren diz que essa seria a melhor e única das opções para que seus amigos fossem salvos e tidos como heróis: cometer genocídio. Ou ele eliminava 80% da população mundial ou o mundo todinho fora de Paradis mesmo incluindo a morte dos amigos. Acontece que pra ele tanto faz. O tanto faz de alguém que cedeu ao ódio a muito tempo. Tudo bem matar quase o mundo todo e tudo bem se meus amigos morrerem com o resto deles, o objetivo é alcançado. Nós vemos uma tentativa de humanização e esperança, quando Eren vai se infiltrar entre os marleyanos deixando o cabelo crescer e ficando sujo. É um arco onde ele tenta ouvir o outro lado pra ver se ainda “vale a pena” seguir com seu plano ou tentar a estratégia do Armin por meio da diplomacia, argumentação e etc (que inclusive é a estratégia usada por Armin em diversos momentos, incluindo o final e que não só funcionou como salvou a pele do próprio Eren algumas vezes). Mas tudo fica por isso e na batalha na praça pública já se torna o primeiro massacre de inocentes concebido pelo tão querido protagonista (querido dos outros, eu acho chatão). Dá pra perceber que Eren tem mais de titã nele do que gostaria, ou até gosta talvez (aqui não falo sobre ele ser o titã de ataque ok). O lado selvagem, instintivo. A destruição sem olhar a quem e até um certo egoísmo de atingir seu próprio objetivo a qualquer custo (mesmo com o argumento de enaltecer os amigos e etc, o que não cola pra mim). Eren é tão cego e primitivo por conta de sua raiva que toma todas as suas decisões com base em seu emocional. Não há uma regulação das suas emoções. Não há um peso de valores. Parece que há um senso de coletividade, mas um coletivo dentro da bolha não é o suficiente. Eren inclusive é o único que para se transformar em titã, morde a própria mão. Um símbolo animalesco que o difere de seus colegas, como um primeiro sinal de sua postura e ação diante do que estava por vir. Claro que existem diversos momentos em que Eren não só é humanizado como mostra esse lado humano, principalmente em momentos de hesitação referente a cumprir certos objetivos por RECONHECER um lado humano em outros personagens. É um protagonista cheio de contradições e falho, mas principalmente mais humano e perto da nossa realidade do que eu gostaria de admitir.
escolhas & liberdade
Livre arbítrio é questionável quando somos reféns de contextos e principalmente das consequências de qualquer que sejam nossas escolhas. Em AOT vemos essa pauta repetidas vezes, onde inicialmente, parece que o objetivo maior é a liberdade do povo. Eren usa isso como um gás motivador, ele quer ser livre dos muros, dos titãs, dos marleyanos, da opressão, dor e injustiças que sofreu e continua sofrendo ao longo da história. Mas ele é refém também do seu temperamento e sua raiva cega, a diferença aqui é que todos pagam o pato por sua escolha. Há quem defenda que ele nunca foi livre, uma vez que se fundiu com todo mundo lá e se conectou com a fundadora Ymir. Ele mesmo diz que não teve escolhas. Mas será mesmo? E o papinho dele na orelha de Ymir? E o backstabbing com o Zeke? Seus outros colegas enfrentam os mesmos dilemas, mas são regidos por não só outros valores éticos e morais, como também o principal: pensamento racional. É pesado numa balança estratégica o que deve ser feito, os riscos, benefícios e perdas. Hange diz que genocídio é errado e não justificável, e que é preciso lutar em prol inclusive daqueles que nunca saberiam os nomes. Levi escolhendo Armin ao invés do Erwin (o melhor casal que nunca existiu). Jean tem a oportunidade de escolher sair como um herói e viver a vida boa e conhecida se juntando aos soldados defensores de Eren, mas ele escolhe unir forças até com os então “inimigos” para que seus valores morais e de senso coletivo não fossem sucumbidos num falso conforto. Até a Mikasa, que parecia refém de seu amor e gratidão por Eren, fez o suficiente para tomar a decisão certa no final (decepar a cabeça dele e não beijá-lo depois de morto, eeeew). O anime mostra que ambos os lados são oprimidos e opressores. Ambos os lados fizeram lavagem cerebral nos seus habitantes sobre o mundo fora da bolha. Ninguém questiona a crueldade daquilo que lhe é imposto, o medo fala mais alto. Eren é mostrado como aquele que veio para mudar isso, lutando e não desistindo. Mas o resultado é o mesmo: suas escolhas mostraram que ele nunca teve esse poder. Quantos amigos ele perdeu, quantas vezes ele falhou. Não importa o quão determinado você é, o quanto você queira, algumas coisas simplesmente não vão acontecer do jeito que queremos (e independe das nossas intenções). Eren escolhe sua falsa liberdade, tirando a liberdade de 80% da humanidade. Em suma, ninguém é 100% livre, mas dentro de nossas limitações ainda conseguimos fazer ESCOLHAS.
tudo é cíclico
Outro ponto claro com esse final, e com alguns dos arcos é o fardo da repetição. Primeiro o ciclo de ódio e violência onde um oprimido se torna opressor de outro, que vira oprimido e retribui oprimindo e isso vai para além do final. Existem personagens que acabam quebrando esse ciclo com algumas escolhas e posicionamentos (Gaby, Jean, etc), mas outros se repetem. Os defensores do Eren ainda continuaram vivos. Paradis sabe-se lá quanto tempo depois, foi destruída. Seus amigos, tiveram que argumentar para tentar a paz e não serem vistos como inimigos. Tudo começou antes de Ymir, e assim continuou depois dela, depois dos titãs, depois de qualquer cidade. Isso não significa que a destruição total e completa de todos os seres humanos é a reposta. Como Armin mostra, a felicidade não é um sentimento eterno. O felizes para sempre não existe. O que faz a existência valer a pena são os momentos. Os pequenos e até banais acontecimentos. Não é uma romantização de olhar pelo lado positivo da coisa, mas sim a verdade. Até Eren teve momentos assim. O sentido da vida além de uma falta de sentido, é estar vivo. É tentar fazer da própria existência a melhor possível. Não em produtividade mas uma vida que te preencha no que dê pra preencher. Não vai dar pra ter uma completude perfeita e e eterna pois isso não existe. Nós somos capazes através de ações, quebrar certos ciclos, mas somos fadados a repetir coisas que talvez estejam fora de nosso controle.
mulheres
Mulheres escritas por homens na cultura asiática, é um negócio que precisa mudar com urgência. Claro que aqui não seria diferente.
Desde o começo eu odiei a Gaby, mas agora eu entendo porque. Gaby é a representação do início de um novo ciclo, na história e em geração. Ela é a imagem CUSPIDA do Eren. Tem o mesmo fogo no cu pra destruir e lutar pelos seus objetivos, chata, birrenta, sem escrúpulos. Mas ela tem a sua redenção quando quebra o ciclo da violência depois de matar a Sasha e conviver com os eldianos em Paradis. Gaby pensa sobre o que lhe acontece e aquilo que fez, então ESCOLHE fazer diferente. Eren fez sua escolha oposta.
E a Mikasa, que como uma protagonista, é praticamente um dos personagens mais VAZIOS da saga toda. Além de rasa suas motivações são fruto do mundinho machista, ela existe para ser submissa e subserviente. Tudo, digo TUDO, o que ela faz é para proteger Eren e seus amigos. Não há um PINGO de personalidade. Mesmo quando ela matou seus sequestradores quando criança, foi um ato após uma ORDEM do Eren. E toda sua vida gira em torno do Eren. Mesmo que ela seja forte e poderosa e a melhor guerreira de Paradis. Ele ofende ela, dizendo inclusive praticamente isso tudo aqui, e MESMO ASSIM ela vai lá defendê-lo de levar um soco do Armin. Até que então, ela cruzou a linha no genocídio. “Hm… talvez não vale a pena eu defender alguém que quer matar a humanidade todinha, eu inclusiva”. PORRA MIKASA (mas antes tarde do que mais tarde). Inclusive esse é o único ponto de desenvolvimento dela, que fizeram ligar com Ymir, pois ela representa a quebra de um ciclo de amor doentio e tóxico e submisso, que a Ymir não conseguiu quebrar sobre o Rei Fritss. O peso da sua significância CITADO no final, não faz jus. Não funcionou porque ela nunca foi uma personagem bem desenvolvida. Aliás NENHUMA personagem mulher em AOT é bem desenvolvida. Todas rasas, sem complexidade, sem personalidade. Ninguém é bem desenvolvido quanto os personagens masculinos. Os pequenos momentos de Sasha, Hange, Historia, etc não dizem NADA. É como um lembrete de “ok temos mulheres aqui diferentes e que fazem coisas que os homens fazem” mas morre aí. Parece que só pra preencher uma cota. A própria Ymir, calada, sem olhos é uma analogia não só para sua própria história, mas para a representação feminina nos mangás e animes. Mulheres não são personagens únicas, elas são meios e ferramentas que ajudam o protagonista masculino atingir seus objetivos.
o final
Não acho que o final poderia ser outro. A história toda é muito bem amarrada levando para todos os momentos mostrados no episódio final. A destruição, fruto da frustração de Eren em além da muralha encontrar MAIS DO MESMO ao invés de um paraíso limpo. As guerras no futuro se repetindo. Soldados e exércitos ainda formados por medo e retaliação. Mikasa continuou com aquele TRAPO SUJO no pescoço eternamente, mostrando que nunca seguiu o baile e que realmente sua existência até o dia da sua morte girou em torno do Eren. Eren agindo como um moleque mimado, machistinha, incelzinho como sempre foi numa tentativa de humanização. Armin se colocando como cúmplice assumindo sua parte na responsabilidade na morte de inocentes (o que nunca teria acontecido se não fosse vcs já sabem o quê). Enfim.
Produções artísticas e audiovisuais são uma das principais fontes de escapismo e lazer, e muitas vezes queremos esquecer um pouco da vida real. Mas o final de AOT mostra um final tão realista que chega a doer. Algo felizes para sempre e nada acontece feijoada seria simplório demais para toda a complexidade construída até aqui. Eu adoraria assistir um anime onde o protagonista não é um moleque chato, escandaloso e egoísta disfarçado de bom coração porque ama os amigos.
Vale a pena consumir o anime e o mangá. O que não vale é enaltecer o protagonista, dizer que ele está certo e ser conivente com genocídio.
Gosto muito do Charlie Day e da patotinha da comédia dele. Vi Fool’s Paradise e achei…ok. Nele um publicitário encontra um paciente de uma clínica psiquiátrica que não fala nada, que é igualzinho um de seus atores decadentes. Nosso protagonista acaba ascendendo e caindo com fama, dinheiro entre outras coisas sem dizer uma única palavra. Bom pra refletir e perceber o quanto os outros sempre vão ter uma conclusão por conta, sem parar pra te perguntar nada e muito menos mostrar interesse em te ouvir.
Já Showing Up prometeu muito e cumpriu pouco. Uma artista é o foco passando por sua família, amigos e colegas mostrando suas inspirações pra sua arte. Achei entediante apesar dos bons momentos e ótimo elenco.
Women Talking acompanha um grupo de mulheres isoladas numa colônia religiosa onde são violentadas pelos homens todos os dias. Elas debatem sobre deixar pra trás esse mundo de violência e tentar se posicionar. Mulheres falaram e eu ouvi tudinho. Também queria abandonar o mundo dos homens e partir para uma colônia formada se possível apenas por mulheres.
Eu não lembro nada dos anteriores mas vi Insidious: The Red Door. Nesse com repressão de memória e adolescentes, encarando o passado e indo ainda mais para o além. Achei tudo meio fraco e passado batido, um final meio meh.
Americanos e a podridão da indústria farmacêutica são retratados em Pain Hustlers. A visão do lucro em cima de medicações e ações inconsequentes custando a vida das pessoas. Bom recado, mas fraco.
A decepção da semana foi Nefarious. Um psiquiatra vai avaliar um prisioneiro que diz que é um demônio encarnado e prevê que o mesmo vai matar três pessoas naquele dia. Aí coisas acontecem. Achei muito de cunho religioso debochando de quem é cético e não acredita nessas coisas. Ruim.
E a grata surpresa foi Spring. Um cara cansado da vida de merda vai pra Itália e começa um romance com uma mulher que tem um segredo…. e coisas acontecem kkk Bom demais tanto o mistério quanto a construção da relação e a revelação da “criatura”. (amo lou taylor pucci)
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ah
no mangá mikasa beija a cabeça decepada de eren 8D
Minina esse teu texto é um arraso do caralho socorro. Teu ponto sobre Eren idiota nunca mudar de ideia pra nada e ser só um escravo das emoções dele a hora toda, dá pra fazer um certo gancho ai pro que acontece quando ele começa a ver pasente pressaro futudo e começa a ficar lelé da cuca das ideias já que ficar cego pelas emoções e instintos não deixa de ser meio que isso, né??? E sobre as mulheres foi extremamente on point. O que é triste
Agora junta tu e teus amigos otakus e vai assistir Bocchi the Rock