Basta existir pra ter medo. O medo é uma emoção básica que vem à tona quando estamos em situação de perigo ou ameaça. Não existe um ser que não sinta medo, cada um sabe do seu.
Do medo, de acordo como interpretamos e experienciamos as coisas, surgem outros sentimentos. Rejeição, insegurança, fraqueza, susto que levam a se sentir indefeso, incapaz, exposto, insignificante, inferior e por aí vai. E ninguém quer sentir nenhuma dessas coisas. E muitas vezes não paramos pra refletir que coisas BOAS e POSITIVAS, podem levar por esse caminho de sentimento/pensamento também.
Temos a tendência de nos apegar a tudo que deu errado, com MEDO de que aconteça de novo. Nosso cérebro tem uma função 24 horas por dia, sete por semana de nos proteger. Só que ele falha, porque coloca na caixa da ameaça, coisas que não são uma ameaça. Eu vejo muito isso na clínica, mas não to aqui como psicóloga e vou usar exemplos próximos.
Muitas pessoas têm medo de amar. Conhecer alguém novo e ficar extremamente apaixonado. Mas elas não têm medo do amor, elas tem medo de como ficariam caso tudo desse errado mais uma vez. É como se não valesse o risco de se expor. Pra quê vou tentar se pode dar ruim? E assim ninguém se permite viver o que pode ser bom.
Claro que isso não acontece só com relações. Acontece com trabalho. Mudanças drásticas de vida. Mudanças mínimas de hábitos. Com tudo.
O medo te dá dois lados de uma moeda. Ou ele te paralisa te impedindo que qualquer mudança aconteça ou ele te empurra pra que a mudança aconteça. Os meus medos sempre foram das coisas não mudarem.
Tive medo de viver pra sempre na mesma casa, com a minha família, fadada ao inferno eterno na minha cabeça.
Medo de continuar ganhando 15 reais por atendimento e nunca morar sozinha.
De me envolver em mais um relacionamento tóxico.
De continuar no trabalho onde sofri assédio e dormir às 20h tamanho burnout.
Medo de virar mãe de pet e ser péssima e meus cachorros me odiarem.
Não é uma lista pequena. Mas uma coisa existe em comum com todas essas situações. A incerteza e a falta do controle do depois.
Todo mundo quer ter controle sobre tudo e essa é uma grande mentira que as vozes da nossa cabeça nos conta. É simplesmente impossível. E desapegar desse conceito é difícil, porém necessário. Temos medo de repetir coisas do passado e do que pode ser do nosso futuro.
A vida é um eterno arriscar. Cada escolha é uma renúncia. Cada passo é dado com um sentimento de se fazer o melhor que pode naquele momento, mesmo que o futuro mostre que não é bem assim. É dolorido pensar em arriscar, mas fazemos isso o tempo todo.
No fundo a gente sabe. É que ninguém foi ensinado ou treinado a saber se ouvir. Mas, uma das coisas que eu prego sempre é: só saber não adianta. A vida é feita de ação. E é na ação que a gente enfrenta o medo. É na ação que a gente escolhe o risco e acaba tendo ganhos. Perdas também, mas faz parte.
O que é bom assusta porque parece que a gente não sabe lidar. As piadas autodepreciativas sempre falam do “nossa, agora que cheguei até aqui, o que eu faço?”. O problema é que a gente não se permite nem tentar percorrer o caminho pra chegar até lá. É como se tudo que fosse bom se resumisse a eventos extremamente aleatórios ao longo da nossa vida. E não precisa ser assim.
O futuro só acontece se plantamos sementes no presente. O medo faz com que esperamos que as flores no jardim simplesmente apareçam. E cada dia de terra seca parece desencorajar que se recomece um novo plantio.
Sei que existem condições sócio-econômicas-histórico-culturais para se considerar, então vale cada um olhar pra própria realidade, claro.
O medo vem como um sinal. Você sabe ouvir seu medo? Sabe questionar o que ele significa e o que está querendo te dizer? Com isso também é importante olhar para trás e refletir sobre tudo o que já vivemos, superamos e sobrevivemos. A vida não é apenas um oceano de coisas ruins.
Espero que nas profundezas do seu medo, você encontre coragem para mergulhar e se deparar com recifes de coral de coisas boas.
Espresso da semana
Já comecei errado com Girl in the Basement que é baseado num caso real de uma menina sequestrada pelo próprio pai aos 18 anos e passa sua vida inteira num porão sendo violentada de diversas formas e tendo inclusive 4 filhos do próprio pai. Só nojo e raiva.
Pra aliviar vi Tumbledown onde uma viúva quer escrever um livro sobre seu marido morto, um músico. E com a chegada do gostoso do Jason Sudeikis, uma nova possibilidade de seguir em frente aparece. Bem gostosinho. Eu com certeza esqueceria meu marido morto (ou vivo) pra viver um romance com o Jason.
Finalmente encarei ver Imagine Me & You onde a florista de um casamento e a noiva (que casa com um homem sem graça) acabam se apaixonando. Chorei e fiquei com quentinho no coração. O mundo precisa de mais romance sapatônico com final feliz. Eu também trocaria meu marido pra viver um romance com a Lena Headey.
Burning é aquele tipo de suspense muito bem construído onde sua desconfiança e raiva vão aumentando. A amiga de infância de um entregador volta de uma viagem com um gostoso misterioso e de repente ela some.
O meu favorito da semana foi Marrowbone, que além de um elenco maravilhoso, tem um ótimo plot e diretor espanhol. Uma família pra fugir de um pai criminoso, se esconde numa mansão no meio do mato e coisas acontecem.
La Haine é famoso, é importante mas não me pegou. Três amigos após um protesto tentam voltar pra casa e descobrir o que aconteceu com seu amigo que foi internado após ser espancado pela polícia.
Pensando na minha própria velhice e a possibilidade de morrer sozinha, assisti Lucky que acompanha um ateu de 90 anos e seus colegas de cidade. Ele manja que tá com o pé na cova e rola umas filosofias. Gostei.
In the Mood for Love veio pra provar ser corno une as pessoas. Uma mulher e seu vizinho desconfiam que seu marido e a esposa dele têm um caso. E aí rola uma paixão de chifres. Maravilhoso. Deus abençoe Wong Kar-wai.
Obrigada por ler mais uma edição!
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Nat, esse texto já entrou na minha lista de preferidos da sua news ;) minha relação com o medo é tensa hahaha é sempre bom refletir sobre isso.