Estudar&me interessar sobre sexualidade&sexo e tudo que isso engloba, foi uma jornada, por incrível que pareça, solitária por muito tempo. Conforme as vivências e repertórios se construíram, algumas amarras foram deixando de existir. Talvez esse texto fique grande demais pro email, aí é só você clicar na imagem header pra conferir completo.
que também tem a sua história e própria jornada, foi a primeira pessoa que me convidou pra uma suruba anos atrás. Apesar da vontade, tive minhas inseguranças. E para além das inseguranças estava num relacionamento monogâmico em que o parceiro da época não estava aberto a essa possibilidade. Mas o namoro acabou, o tempo passou, meu laço de amizade com Angelo estreitou e o convite foi reforçado. Dessa vez eu fui.
Vivenciar minha primeira suruba foi incrível e a segunda também, mas não é sobre isso o foco de hoje. Fui compartilhar minha experiência com grupos diferentes de amigos e o que percebi é que: todo mundo fica curioso sobre. Dá pra sentir no tipo de pergunta, nas expressões faciais e reações, que existe ali uma vontade. Mas junto com a vontade: o receio. Porém o fato comum é: todo mundo se surpreende quando conto como é o rolê de fato. Foi pensando nisso que resolvi unir forças com
pra responder as perguntas das pessoas (que me mandaram anonimamente) e assim quem sabe abrir um pouco o leque de possibilidades pra quem lê e quem sabe assim, se informar e até se livrar de possíveis preconceitos.Sou mera novata e iniciante. Mas o meu amigo tá nessa à tempos. Ele inclusive é um dos organizadores profissionais da Positiv Party, que não é bagunça. Juntei nossa conversa em respostas práticas pra vocês. Algumas infos podem ser repetidas em respostas diferentes para ressaltar alguns pontos que precisam ficar claros, ok?
Como é o rolê de fato?
É como se fosse um churrascão dos brother porém sem churrasco. Tipo aquele rolê na chácara com um monte de gente (com número limitado de pessoas), mas existem algumas possibilidades. Talvez você olhe pro lado e existam pessoas peladas. E em alguns lugares desse rolê, pessoas transando livremente. Mas ressaltamos que ninguém é obrigado a nada. Pode ficar de roupa, pode transar com uma pessoa só, pode não transar com ninguém.. enfim. O ponto principal é consentimento. Não é uma kitnet em SP que todo mundo que entrar tem que obrigatoriamente se pegar e enquanto você tá lá de boa de repente tem um dedo dentro de você numa maçaroca de tanta gente que você não sabe nem de quem é. Suruba não é bagunça. Existem jogos e dinâmicas de integração pra deixar as pessoas mais à vontade e interagirem, inclusive! Mas ao invés do churrascão na chácara, é num motel (com uma suíte de três andares que talvez tenha gente que esteja na mesma festa e vocês nem se trombem). Ângelo complementa que às vezes isso pode parecer meio broxante porque muita gente vai com expectativas altíssimas e fora da realidade. Ele até gosta de usar o termo piquenique ao invés de um churrasco, porque cada um leva sua comida e conversa bastante entre si. É uma maneira de afeto e troca, inclusive até as pessoas se sentem mais seguras porque ninguém vai chegar passando a mão em você, sem que você peça de fato. É importante que todo mundo esteja focado no consentimento e fazendo o que quer, do jeito que quer. Onde você pode expressar suas vontades e realizá-las, com quem estiver de acordo. Inclusive é importante que as pessoas saibam e aprendam a lidar com o não. Levar um não nesse rolê, não significa que você é um monstro, nem que é feio, significa simplesmente que a outra pessoa não está afim naquele momento, e é isso aí.
Qual a chance de ser rejeitade no rolê? Ou de ninguém chegar em mim?
A chance sempre vai existir, numa suruba ou em qualquer outro lugar. Inclusive é algo de se ter em mente de que ok, você pode ficar sozinhe durante a festa. E isso pode ser um empurrão pra que cada um dos participantes tome principalmente, atitudes ao invés de sempre esperar pela movimentação dos outros. Isso até mesmo tirando um pouco dessa idealização das pessoas, de medir o aproveitamento por quantidade de transa, quanta gente está chegando em você etc. Ângelo como nosso expert reforça a ideia dentro do exemplo que é: Quando você vai para a balada/piquenique/churrasco, você faz essa conta? Você pensa “acho que eu não vou no aniversário do meu amigo, afinal quantas pessoas vão me rejeitar lá”? Ele acredita que as pessoas também não devem fazer essa conta ao ir pra Positiv, porque chegando lá você descobre o quão legal é, que a dinâmica pode ser sobre outra coisa e bom… acaba fazendo coisas gostosas também.
Então se não é “sobre isso”, é sobre o quê?
É sobre contatos, conhecer gente. Sobre estar nesse espaço que você encontra pessoas que têm um pensamento parecido com o seu, que têm uma vivência parecida com a sua e que têm um interesse parecido com o seu. Você estar num espaço que as pessoas têm uma visão diferente sobre sexualidade e desejo. E geralmente acontecem dois cenários muito comuns: você vai na festa, você não transa com ninguém, só que você conhece um monte de gente. E aí chega na hora de ir no fim da festa, você vai dar tchau e dá um beijo e percebe que rolou um interesse. Então acaba marcando um rolê depois, e aí quando percebe, já tem mais contatinho do que agenda. (meu caso). Ou… você vai na festa e transa com 30 pessoas que você nunca mais vai transar na vida ou só vai transar/ver em festa. E tudo bem. E talvez conhecer as pessoas para sair depois possa gerar um pouco mais de segurança e abertura.
Por quê é diferente de SWING?
Ângelo tem pesquisado muito sobre sexo&grupos. O Swing (que a gente conhece hoje como a troca de casais) é uma instituição antiga porém historicamente recente, por ter entre 60, 70 anos. É extremamente heteronormativo, cisnormativo e basicamente: troca de esposas. Além de ser muito monogâmico e a maioria das pessoas que vivem isso, fazem na base do sigilo. É um grupo pequeno, seleto e elitista, com seus próprios símbolos. Por exemplo o símbolo da chave (do marido) e o cadeado da esposa. Na Positiv, não são ideias que os organizadores (e a grande maioria dos seus frequentadores) compactuam. A suruba é uma vivência “anti-casal”. A organização&participantes tenta chegar lá no dia esperando que você saiba que lá dentro você não é de ninguém e sua parceira não é de ninguém. São pessoas separadas, são pessoas individuais. Então sim, é possível que no dia da festa, alguém dê em cima de você e não da parceria. E como é você vai lidar? Se os organizadores percebem que não vai ser massa, que você não vai lidar bem, não vai gostar, você provavelmente não vai ser chamado. Porque é para ser uma situação sem ter o casal como foco ou cêntrico. E o swing é casal cêntrico. Não atoa, troca de casais e entrando no lugar de classe, na casa do swing você paga por um casal hétero, senão.. não entra. E se quiser entrar sozinho, vai de 200 o casal pra vamos supor, 700 reais. Sendo por si excludente, a suruba vai contra isso. Afinal é para ser um espaço cada vez mais inclusivo para todes.
Mas e casal na suruba?
Na Positiv nem passa na entrevista, principalmente se for um casal hétero, cis e monogâmico. Mas primeiramente é preciso entender da onde vem esse desejo como algo individual. É de um parceiro só e o outro está aceitando pra fazer a vontade de quem ama? É dos dois? Como isso é visto/discutido? Pode qualquer configuração de participação? Por exemplo: se a esposa quer transar com sete homens numa festa e o marido só quer um menage com outra mulher mas não quer que a esposa realize o desejo dela, já sabe-se que vai dar merda e que vai contra tudo que os valores da festa defendem. Logo, não é o melhor lugar. Mais uma vez: a suruba é para os indivíduos viverem seus desejos e não tem foco no casal. Sugestão então pra esses casais interessados? Vai pra balada falar que curtiu a vibe de alguém. No fim das contas tudo é político, e os organizadores não são “arranjadores de marmita”. Afinal estamos falando de pessoas e não de produtos. O melhor conselho é vai ler e estudar. Entender seus desejos, nomeá-los. Regina Navarro Lins tem vários livros e trabalha isso diretamente com casais já formados e monogâmicos que querem explorar ou passam por crises nesse sentido.
Então quais os pré-requisitos pra participar especificamente da Positiv?
Não ser um homem hétero cis. Pode até se inscrever mas irá para o final da fila. Também precisa ter um letramento básico em questões LGBTQIAP+ e em não-monogamia. Quer aprender sobre? Tem muitos livros e pessoas falando sobre isso na internet, dá pra aprender. Mais uma vez, é sobre política e não sobre uma festa de putaria.
Ok, então se eu for… se der ruim como que faz pra parar?
Você pega e fala assim: para. Pode falar não. Pode mudar de idéia. Pode parar no meio do caminho. Inclusive a festa oferece esse espaço seguro de que você pode parar e levantar pra ir tomar um café a qualquer momento. você aprende a entender o seu corpo, a ouvir ele, a entender o seu prazer, entender que às vezes você precisa dar uma segurada. E tá tudo bem. Tudo é dito, verbalizado, consentido. A regra zero é: ninguém é obrigado a nada em nenhum momento.
E proteção? Como saber se as pessoas que vão estão “limpas”?
Ninguém está sujo. Não existe sujeira, existe doença. Existe infecção. E esse é termo que a gente precisa abolir. IST não é sujeira. É um termo que se usa muito, por exemplo, droga, em quem tá viciado. Ah, eu não tô usando faz muito tempo, eu tô limpo. E IST não é um vício. E transar não é uma coisa suja. Segundo ponto, o uso de preservativo é obrigatório. É fácil, é só pedir, falar: coloque a camisinha. A gente não pode por lei, obrigar pessoas a fazerem teste de IST, porque ele é um documento sigiloso e ninguém pode obrigar você a mostrar o seu teste de IST pra ninguém em nenhum lugar. Então é sugerido que os participantes façam pelo SUS, porque é grátis e fácil e rapidinho. É também uma parte da responsabilidade ser sua. Você mesme pode levar 100kg de camisinha, levar todos os tipos para além dos que são disponibilizados em todos os cantos da festa. Moralismo não é bem vindo. As pessoas devem se responsabilizar sobre si para além de ficar jogando apenas algo como culpa e peso da festa em si.
E é tipo sense8?
Não, mas pode ser se quiser. Suruba não necessariamente significa que vai ser uma cama para 40 pessoas ou que você tá sentado, de repente, tem uma mão no seu genital e tá levando uma cotovelada do nada. Não é um rolê enclausurado onde todo mundo é obrigado a transar e a pegar todo mundo. As pessoas têm esse imaginário de todo mundo enfiado num quarto, todo mundo transando adoidado com todo mundo e aí também entra a parte do consentimento. Acham que alguém vai se enfiar na sua foda e você é obrigado a seguir com isso. A suíte onde é realizada a festa tem em torno de 400m² e possui três andares. Tem espaço e a pessoa não vai passar a mão em você sem consentimento, sem trocar ideia, sem saber. Acaba rolando muito a configuração do sexo entre duas pessoas e no fim das constas é saber que você vai possivelmente transar em um lugar que tem outra pessoa transando do seu lado. Às vezes pode acontecer de rolar uma mãozinha ali, “Oi, posso encostar em você? Pode”, e aí encosta. Não é sempre que rola o todo mundo “começar junto”. Às vezes a coisa vai evoluindo, você tá fazendo algo mas cansou. Só que tem uma galera aqui do lado que tá animada. Você pode propor pra quem você está, parar pra descer e conversar/comer um negócinho, ou vai você.. enfim.
A Positiv
O Ângelo é um dos organizadores da Positiv, que é um evento que acontece aqui em São Paulo. Esse ano tá rolando uma edição por mês. No site da festa você pode encontrar outras infos sobre como funciona, quais são as regras e quem são os rostinhos por trás da rolê. Pelo instagram você pode acompanhar a agenda com as datas de cada edição e quando abre inscrições pra você poder participar. Tem formulário, tem entrevista, tem seleção. E você pode mandar direto lá suas dúvidas específicas, ok? Se quiser pode mandar perguntas aqui também.
E a gente?
Sexo, desejo e libido são importantes pra você? Como você lida com tudo isso? Transar é político e estar aberto às possibilidades pode ser libertador em vários sentidos. A vida é curta demais pra seguir roteiros normativamente impostos… inclusive no sexo! Com a onda de conservadorismo crescendo talvez seja a hora de questionar se você está sendo fiscal de foda alheia e se podando de viver coisas incríveis porque não se libertou de raízes castradoras e amarras de submissão entre outras prisões, principalmente se você é mulher. Participar pela primeira vez foi um marco pra mim em vários sentidos. Nunca imaginei que me sentiria tão à vontade com meu corpo na frente de tanta gente que não conhecia e principalmente sem medo, sem assédio, sem me preocupar com nada além de papear e me divertir. A experiência foi completamente diferente do que eu imaginava e foi ótimo me surpreender positivamente. Tão mais simples, tão libertador, acolhedor. Não é atoa que tem processo de seleção e até agora, só conheci gente incrível no rolê. Toda vez uma roda de gente pelada falando sobre jogar RPG. Outra comentando de bordado. E em algum momento eu convidando as pessoas pra irem no karaokê comigo, lógico.
Espero que vocês estejam de coração aberto à novas experiências e conferir o trabalho de festa adulta de gente pelada do meu amigo pessoal, que além de ótimo organizador experiente cnpj, é um ser humano incrível e escreve newsletters que são um deleite de ler por aqui. Convide seus amigos pra suruba ou faça novas amizades direto lá! Gostos demais.
Robot Carnival É uma antologia dos anos 80 com vários curtas que se passam com robôs, risos, mas que contam histórias diferentes em estilos únicos de cada diretor. Tem muita crítica social e alguns são tão lindos visualmente que vale só pra ficar babando mesmo. Excelente!
Mickey 17 A mais nova sátira cheia de crítica social e personagens cativantes do reizinho Bong Joon Ho, é maravilhosa! Mas a minha crítica vocês vão ter que ouvir o próximo episódio do podcast do Cinemação, que participei como convidada e hablei muito em defesa desse cristalzinho.
Moana 2 A gata vai numa jornada do nada e nada funciona nesse filme desastroso que não dá pra defender. Eu amo o primeiro mas nossa que fiasquinho. Ainda é bonito, tem elementos que se repetem mas… Totalmente esquecível, uma pena.
Bird Uma criança meio negligenciada pelo pai que está prestes a casar, passa muito tempo fora de casa. Se descobrindo na puberdade conhece um querido (te amo Franz Rogowski!!!!) e passa a questionar coisas sobre sua realidade. Amei que tem uma piadinha envolvendo Barry Keoghan&Murder on the Dance Floor rs Um filme bem honesto e direto, ao mesmo tempo atencioso e crítico. Dito isso gostei, mas infelizmente fiquei entediada várias vezes rs
Gentlemen Broncos Um estudante fanfiqueiro conhece um autor famoso que acaba roubando suas ideias e ganhando muito dinheiro. Filme bobinho demais nossa kkk Mas tem o Jemaine Clement & Sam Rockwell.
Pet Sematary: Bloodlines Gravamos o próximo Rainhas do Grito sobre ele, então pra saber a opinião completa… já sabe! Vai ter que ouvir o episódio semana que vem!
Perfect Blue Revi essa pedrada e que loucurinha né. Uma artista pop vai se arriscar em ser atriz de uma série famosa mas coisas começam acontecer… Continua atual e complexo e incômodo. Maraviloso, ABSOLUTE CINEMA.
Street Trash Pessoas em situação de rua estão prestes a serem eliminadas pelo governo e ao tentar sobreviverem, coisas acontecem. Um remake de uma podreira clássica, mas esse foi bem difícil de engolir. Tem efeitos práticos maravilhosos e uma ótima crítica social mas…
The Legend of the 7 Golden Vampires Eita que esse foi difícil mas assisti pra gravar pro dia do lixo! Mas assim… não esperem muita coisa além de… racismo. Difícil
Textaço. Acho maravilhoso que mais e mais pessoas escrevam sobre suruba como ela é: simplesmente sexo, sem nenhuma abertura pra juízos de valor de qualquer pessoa dentro ou fora da festa. E quanto ao Swing, vocês têm total razão. É excludente e majoritariamente cis hetero branco. Minha primeira suruba foi numa casa dessas, muitos anos atrás. E como estudante de história, então, fiz aquela análise lacradora do ambiente: muito velho rico (meu carro era de longe o pior dali), branco, que usava droga no banheiro e tava lá ou traindo a mulher, já que profissionais do sexo costumam acompanhar nesse tipo de ambiente só pela pechincha do casal, ou levando a mulher pra sair da rotina e todas aquelas circunstâncias tão comuns no dia a dia. Fiquei muito feliz com o texto e com a desmistifcação da coisa toda. ❤️